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Pesquisadora atua na proteção contra incêndio no setor elétrico do Brasil


Dayse Duarte

Dayse Duarte nasceu em Recife, Pernambuco, Brasil. É doutora em Engenharia de Proteção a Incêndios, formada pela Universidade de Edimburgo, na Escócia. Atualmente, é professora no Departamento de Engenharia de Mecânica da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e  diretora e fundadora do Grupo de Pesquisa em Incêndio e Confiabilidade (RISCTEC, integrado na UFPE), no qual, coordena, gerencia e orienta atividades de pesquisa.

Entre 2007 e 2013, Dayse representou o Brasil no grupo de trabalho WG A2-33 sobre Fire Safety Practice do International Council on Large Electric Systems-CIGRÉ, com sede em Paris, e que engloba mais de 86 países. Tem trabalhado com este tema no Recife desde 1995 e seus principais interesses acadêmicos são nas áreas de dinâmica de incêndios, gerenciamentos do risco de incêndio e engenharia de proteção de incêndio. Como parte de seu trabalho ela desenvolve pesquisas com os setores elétricos e petroquímicos no Brasil na área de segurança de incêndio.

Dayse é membro do Conselho Consultivo do Instituto Sprinkler Brasil desde sua formação, contribuindo com as discussões para a melhoria e desenvolvimento do setor no País.

Confira a seguir a entrevista realizada com ela.

ISB – Como teve início sua relação com o setor de segurança contra incêndio?

Dayse – Em 1983 após concluir o curso de Engenharia Elétrica, na Universidade de Pernambuco, iniciei o curso de Engenharia de Segurança e fiquei empolgada, do ponto de vista cientifico, com a chama. Vocês podem estar se perguntando como a Engenharia Elétrica me conduziu a Engenharia de Incêndio; vou explicar. Michael Faraday, cientista inglês (1791-1867), meu velho conhecido do princípio da indução eletromagnética, que é o princípio de funcionamento dos geradores elétricos e transformadores, na Royal Institution em Londres, em uma aula para as crianças, com uma vela acesa demonstrou o princípio da combustão da chama. Após concluir o curso de Engenharia obtive uma bolsa de estudos para fazer mestrado em Engenharia de Incêndio no Worcester Polytechnic Institute (WPI). Em 1990, por indicação do meu professor, Robert Fitzgerald, fui fazer meu PhD na Universidade de Edinburgh, com o professor Drysdale e retornei ao Brasil, em 1994, pois meu sonho sempre foi fazer pesquisa na área de Engenharia de Incêndio no Nordeste, em um laboratório com as janelas voltadas para o mar. Desde 1995 sou professora da Universidade de Federal de Pernambuco.

ISBComo tem visto o desenvolvimento da área ao longo deste período e o que considera como fato marcante?

Dayse No início do século 19, com o advento da segunda revolução industrial e do crescimento da população nas cidades, os incêndios foram claramente reconhecidos como uma grande ameaça aos negócios, ao comércio e à sociedade. Uma densidade demográfica elevada é um fator catalizador de incêndios.

Nos últimos 100 anos, o conhecimento da dinâmica do incêndio passou do conhecimento empírico e está consolidado em bases científicas. Nos Estados Unidos, milhões de dólares são investidos para lançar uma luz no nosso entendimento sobre o comportamento do incêndio, a exemplo do National Institute of Standards and Technology, os laboratórios da FM Global, Underwriters Laboratories, entre outros. Como resultado, uma literatura científica e técnica tem surgido ao longo dos últimos 25 anos. Hoje é comum abrirmos um jornal científico sobre incêndio e nos deparamos com sofisticadas teorias da física e química que dão o embasamento de equações diferenciais sobre as quais alicerçamos softwares para prevermos o comportamento dos incêndios.

ISB – Como surgiu a oportunidade de participar do Conselho Consultivo do ISB?

Dayse – Foi com imensa alegria que certo dia, no final de tarde, recebi um telefonema de Marcelo Lima, diretor do ISB, perguntando se eu gostaria de participar do Conselho Consultivo do Instituto. Eu só perguntei qual seria o meu dever de casa, pois o meu objetivo é divulgar os conhecimentos da Engenharia de Incêndio. É meu entendimento que o conhecimento contribuirá para preservar a vida das pessoas quando em situação de risco.

ISB – A sra. atua em outras iniciativas como esta? Por que elas (as iniciativas) são importantes para o setor?

Dayse – No período de 2007 a 2013 representei o Brasil no grupo de trabalho WG A2-33 sobre Fire Safety Practice do International Council on Large Electric Systems-CIGRÉ, com sede em Paris, e que engloba mais de 86 países. Em 2013 o CIGRÉ publicou o Guide for Transformer Fire Safety Practices. Em 2014, o Capítulo 5 do Guide for Transformer Fire Safety Practices, de nossa autoria, foi ampliado com a publicação do Guia para Avaliações de Incêndio em Transformadores de Potência não Confinado e a Óleo Mineral, o qual foi fruto das reuniões técnicas do Grupo de Trabalho A2:04 do Comitê Nacional Brasileiro de Produção e Transmissão de Energia Elétrica-CIGRE/Brasil. O GT A2:04, sob minha coordenação, também contou com a participação do ISB e empresas da Eletrobras. No final do ano passado, foi criada a Frente Parlamentar Mista de Segurança Contra Incêndio, no Congresso Nacional, incluindo definitivamente o tema na agenda legislativa do País. Tendo sido convidado pelo Presidente da Frente, Deputado Vicentinho, para participar do seu conselho consultivo, o diretor-presidente do Cigre-Brasil, Josias Matos de Araújo, nomeou a mim e ao engenheiro da CHESF, Miguel Medina Pena, para representarem o Cigre-Brasil, o que certamente contribuirá para implementar uma legislação moderna e inovadora no tocante a segurança contra incêndio no Brasil.

ISB – A sra. já esteve em outros países para tratar de segurança contra incêndio. Há algo que aprendeu nessas incursões que poderia ser feito no Brasil?

Dayse – Conforme mencionado na questão anterior, representei o Brasil no grupo de trabalho WG A2-33 sobre Fire Safety Practice do International Council on Large Electric Systems-CIGRÉ, com sede em Paris, e que engloba mais de 86 países. No ano passado estive em Shangai integrando a delegação brasileira por ocasião do Colloquium Study Committe A2, onde apresentei estudo sobre os incêndios em transformadores de potência no Brasil.

Os incêndios estão presentes em nosso dia-a-dia. Porém, nós, brasileiros, ainda não temos consciência da complexidade e tamanho do problema. É minha percepção que nós temos um problema e que ele é grave e que não podemos continuar a aprender a prevenir os incêndios baseado em nossas falhas, ou seja, nos nossos erros do passado.

Desconhecemos que temos um problema e que ele é grave, por quê?

  1. Inexistência de uma base de dados consistente que possa dar suporte a tomada de decisões quanto a prevenção e mitigação dos incêndio e explosão. A inexistência de uma base de dados dificulta o planejamento de campanhas educativas e mesmo a formulação de políticas públicas apropriadas.
  2. Gostaria de ressaltar que as áreas do conhecimento cientifico definidas pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) não inclui a Engenharia de Incêndios. Como consequência há muitas dificuldades de os pesquisadores da Engenharia de Incêndio no Brasil em terem acesso aos recursos para o desenvolvimento de pesquisas básicas ou aplicadas.
  3. Ausência de laboratórios de pesquisa e certificação de produtos.
  4. Educação profissional e qualificação profissional em Engenharia de Incêndio.

ISB – Como a sra. vê o futuro da área de proteção contra incêndio?

Dayse – Nós, pesquisadores da Engenharia de Incêndio, estamos diante de um desafio que é integrar a dinâmica do incêndio, aos sprinklers, às operações dos bombeiros, com a proteção das pessoas, o desempenho das barreiras de proteção, o colapso estrutural, a fumaça e, também, com diferentes tipos de riscos associados às diferentes edificações e o seu entorno. Integrar todas estas áreas do conhecimento é uma questão grande e complexa.

ISB – Como a academia pode apoiar o trabalho desenvolvido pelos representantes do setor?

Dayse – Responderei a esta pergunta com uma outra pergunta: Como a academia poderá ajudar os vários stakerholders envolvidos na cadeia produtiva da segurança contra incêndio, se as áreas do conhecimento cientifico definidas pelo CNPq não inclui a Engenharia de Incêndios?

ISB – No que diz respeito à legislação, quais aspectos a sra. considera fundamental para evoluirmos na proteção contra incêndio no País?

Dayse – No Brasil, os dados sobre incêndio em edificações são incipientes, talvez devido à autonomia de aferição e método que os Corpos de Bombeiros Militar estabeleceram para consolidar suas estatísticas ao longo dos anos. Os dados nacionais de incêndios foram divulgados pelo IBGE até o ano de 1990, quando por solicitação do Ministério da Justiça foi suspensa a divulgação.

É evidente que temos um problema em relação aos incêndios em edificações, em geral, e ele é grave, pois, não estamos aprendendo com as tragédias do passado. Soma-se a isto o fato de que os nossos códigos e normas não são suficientes para evitar novas tragédias, a exemplo da que aconteceu em Santa Maria, em 2013. É urgente uma legislação que possa ajudar o engenheiro a estruturar o projeto do incêndio, ou seja que explique como as edificações se comportam durante um incêndio.